quarta-feira, 30 de março de 2011

Encobrindo nossos próprios comportamentos

Recentemente testemunhei duas situações em que uma das partes renunciava à possibilidade de manter relação. Mas mais do que isto, o que as situações também tem de semelhança é (1) a alegada falta de compreensão do que sentiam e sua impossibilidade de expressão, pois reconheciam que sua conduta parecia irracional ou ilógica e/ou (2) a dificuldade ou evitação dos estabelecimento de um canal de comunicação.

Escrevo “e/ou” pois (1) eventualmente pode ser a manifestação pública de (2). Fazendo um paralelo, como bem conceituado pelos behavioristas, há aqueles comportamentos considerados encobertos, pois não são observáveis ou observados em público, mas são do conhecimento que quem os emite. Ou seja, (1) pode ser usado para encobrir a real motivação (2). Neste caso, por motivos que poderíamos somente especular, as pessoas desistem da comunicação, o que aparentemente é cada vez mais comum. Um parênteses, outro dia, e não me recordo qual era o articulista, lia no jornal que cada vez mais torna-se rara a possibilidade de uma conversa sem que as pessoas simplesmente coloquem sua opinião baseada num “achismo” raso e pulem de assunto em assunto, ou bem transformam o colóquio numa guerra santa de posições.

Mas (1) é a opção mais instigante pois aponta para um indivíduo que percebe a sua própria incapacidade de perceber-se, o que é um aparente paradoxo, pois parece já possuir consciência. Mas é aparente, pois não necessariamente isto lhe garante a possibilidade de compreender seus “drivers” comportamentais.

Uma das hipóteses foi pesquisada por Drew Westen e outros colaboradores num estudo que comprova "materialmente" a importância das motivações afetivas e emocionais em nossos pensamentos ("Journal of Cognitive Neuroscience" 18:11, 2006). Nada que as teorias sobre afeto não tenham abordado de formas diversas. Segundo Guimarães (Guimarães, F.S. Distúrbios Afetivos. In: Graeff & Brandão, Neurobiologia das Doenças Mentais, Lemos Editorial & Gráficos Ltda, 1993) “todo ser humano apresenta flutuações de afeto em resposta a eventos de sua vida cotidiana. Em algumas pessoas, no entanto estas respostas assumem um caráter inadequado em termos de serenidade, persistência ou circunstâncias desencadeadoras, caracterizando, assim a ocorrência de um distúrbio afetivo. Parece possível afirmar que, a depender da intensidade e qualidade dos nossos afetos e emoções nossos pensamentos ficam absolutamente comprometidos a ponto de nos sentirmos alheios ou estranhos a eles próprios. Favoretto (O Afeto em Psicossomática; 2002) esclarece: “Pode-se chegar à conclusão que o afeto é uma das bases mais concretas que o indivíduo conhece desde o início de sua vida, se esta emoção não for bem solidificada e compreendida de uma maneira positiva e integrada num fator sociocultural dentro dos padrões normais, haverá que interferirão no seu psiquismo apresentando modificações patológicas (transtornos mentais ou doenças psicossomáticas) e até desencadeando problemas comportamentais, causando, assim um sofrimento psíquico para o próprio indivíduo. Ele terá, portanto, dificuldades de interagir com o meio e ás vezes com si mesmo.”

É quase um comportamento esquizóide, pois você não reconhece o seu próprio comportamento, ou melhor, as razões de comportar-se de tal maneira. No limite é como seu houvesse dois “eus”, um que pensa e outro que age de maneira não coordenada e independente. Gosto do exemplo de Eckhart Tolle ( O Poder do Agora, Sextante, 2002): “... Um profundo anseio de destruição, de deixar de existir, tinha tomado conta de mim, tornando-se até mais forte do que o desejo instintivo de viver. “Não posso mais viver comigo”, pensei. Então, de repente, tomei consciência de como aquele pensamento era peculiar. “Eu sou um ou sou dois?”. Se eu não consigo mais viver comigo, deve haver dois de mim: o ‘eu’ e o ‘eu interior’, com que o ‘eu’ não consegue mais conviver. “Talvez”, pensei, “só um dos dois seja real.” O grande desafio é viver em harmonia com o Eu, mas o autêntico!

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